30 de jan. de 2009

Encontro extremamente interessante entre Vanessa Regina (pseudo-jornalista) e Raquel Reis (escritora, boêmia e doida por uma briga intelectual)



Entrevista de Raquel Reis concedida à Vanessa Regina no quiosque de Alegrete (a pedido da autora) numa noite quente de janeiro.



VANESSA REGINA: Como começou sua relação com a escrita?

RAQUEL REIS: Há seis ou setes anos atrás. Foi quando percebi que escrever era uma forma de falar a verdade.

VR: Como funciona seu processo de criação?

RR: Uma mesa de bar, amigos especiais e olhos atentos.

VR: Você escreve somente quando está em bares?

RR: Não, porra. Isso tudo é o princípio de uma explosão criativa que pode acontecer amanhã ou depois. Primeiro observo, depois vomito tudo.

VR: Já tem livros publicados?

RR: Não. Mas já publiquei muita coisa em jornais. Vou lançar alguns textos em uma coletânea esse ano. Depois um livro de poesias só meu daqui a algum tempo, quem sabe.

VR: O que você acha do mercado editorial gaúcho? É satisfatório? Dá oportunidade a novos autores?

RR: Sei lá, porra. Vou lançar meu livro e leia quem quiser. Quero apenas dividir com os outros o que me revira o estômago.

VR: Você se considera uma poetisa, uma contista, como poderia classificar você?

RR: Apenas uma escritora, que vai de poemas até peças de teatro. Só não passei ainda pelo romance. Não gosto de rótulos. Quem rotula não tem opinião.

(no meio da entrevista Raquel acende um cigarro e larga baforadas descaradas em mim)

VR: O que a literatura significa para você?

RR: Tudo. E nada.

VR: Quais suas influências literárias?

RR: Não tenho influências. Não gosto de copiar ninguém.

VR: Então, quais são suas leituras?

RR: Florbela Espanca, Sylvia Plath, Manuel Bandeira, Drummond, Hilda Hilst, Vinicius de Moraes.

VR: E os romancistas?

RR: Graciliano Ramos.

VR: É verdade que você também compõe letras de música?

RR: Quem te disse isso?! Bem, é verdade.

VR: As letras falam de que?

RR: Solidão, abandono, amor. Tudo que uma mocinha como eu precisa vivenciar ...

(risos debochados de Raquel)

VR: A propósito, qual a sua idade?

RR: 23 anos de um amadurecimento forçado pelas circunstâncias.

VR: Por quê?

RR: Porra, não falo de minha pessoal. Ok?

VR: Há muitos conflitos em Raquel Reis?

RR: Sou o próprio conflito. Vivo intensamente minhas experiências. O que fica à parte de tudo é a outra personalidade.

VR: Há quem diga que Raquel Reis é um personagem, quase um heterônimo. O que acha disso?

RR: É possível, porra. Às vezes inventamos outras faces para falarmos a verdade.

VR: Você é uma intelectual?

RR: Não. Sou o que você está vendo aqui. Intelectual é aquele cara que lê 1000 livros por ano e escreve crítica de poesia pro jornal. Eu só tenho senso crítico, boto o dedo na ferida e escrevo sem me importar com que os outros vão pensar.

(nesse momento tive o ímpeto de me levantar da mesa e encerrar a entrevista – isso foi um ataque pessoal – mas o profissionalismo falou mais alto)

VR: Escrever é uma paixão? A literatura faz o que por você?

RR: Sim. È como respirar. Sinto um “tesão intelectual” pelas pessoas que escrevem . O que a literatura faz por mim? Nada. Não paga minhas contas.

VR: Você poderia escrever para o meu blog, o que acha? Seria uma honra...

RR: Quem sabe... mas olha esse puxasaquismo doidivano que eu nao suporto, porra.

VR: Você se considera uma figura polêmica, transgressora?

RR: Que pergunta é essa, porra? Só porque tive uns ataques de bipolaridade em público virei transgressora, agora?!

(nesse momento Raquel pede uma cerveja para se acalmar. E eu peço uma água mineral para manter a neutralidade)

VR: O que você faz além de escrever? Nas horas vagas, por exemplo?

RR: Leio, ouço música e dou entrevistas a pseudo-jornalistas.

(Um meio sorriso de Raquel para mim)

VR: O que está ouvindo atualmente?

RR: Maysa. Intensa como eu.

VR: O que acha do panorama cultural de Alegrete?

RR: Há gente se mexendo em busca de coisas novas. Mas só isso não faz milagres.É preciso apoio da cidade. O que deve mudar é o pensamento.

VR: Há muitas semelhanças entre Raquel Reis e Vanessa Regina?

RR: Talvez apenas literárias. Vanessa é muito racional, prática, lógica. Eu sou o oposto do convencional.

VR: Quais seriam as semelhanças literárias?,

RR: Observação para escrever. Mas ela precisa vomitar (escrever) mais. Falar o que incomoda. Provocar.

VR: E você, como se define?

RR: Alguém com incertezas profundas.


VR: Que conselho você daria para jovens escritores?

RR: Escrevam.


VR: Qual sua relação com Vinicius de Moraes? Vejo algumas semelhanças...

RR: Eu e Vinícius fomos parceiros de bar em outra encarnação.

VR: O que falaria para as pessoas que ainda não conhecem seu trabalho?

RR: Não sou perfeita. Parem com a hipocrisia, porra. E me leiam, se quiseram.

VR: O que faria se hoje fosse seu último dia de vida?

(silêncio absoluto)

(Uma risada sarcástica)

RR: Pediria ao garçom uma caneta. Morreria escrevendo.

VR: O que te entristece Raquel?

(olhos marejados)

RR: Quando sinto uma puta saudade de alguém.

VR: Lirismo e transgressão podem viver lado a lado?

RR: Sim. A transgressão está em toda a parte. Principalmente na poesia, através da palavra.


VR: Qual seu maior defeito?

RR: Pensar demais.

VR: O que te faz chorar?

RR: Quando uma solidão sacana invade meu peito.

VR: O que está escrevendo no momento?

RR: Alguns fragmentos de observações e uma peça de teatro.

VR: O que é a morte para você? Vejo que algumas leituras poéticas suas estão circundadas por isso.

RR: Algo ensurdecedor. Mas não se preocupe. Não sou uma escritora suicida em potencial.

VR: Uma frase?

RR: “... uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que se não se sente bem onde está , que tem saudades... sei lá do que!” (Florbela Espanca)

VR: Uma poesia? E por quê?

RR: “Traduzir-se”. Ferreira Gullar. Há Raquel Reis e Vanessa Regina no mesmo texto.


(depois da longa conversa e algumas cervejas; eu tomei três águas minerais; despeço-me de Raquel. Apesar de arredia é uma boa moça. Só precisa de espaço para se manifestar.)

VR: Obrigada, Raquel.

(ela se levanta da mesa um tanto cambaleante, mas vira para trás a tempo de ouvir minha pergunta).

VR: Mas uma última pergunta.

RR: Sim?

VR: È verdade que Raquel Reis é o alter ego de Vanessa Regina?

RR: Porra...

Um comentário:

  1. Há muito tempo eu esperava por esta entrevista, mas veio em hora certa, Raquel está muito mais madura. Acredito que, de certa forma, minhas leituras das poesias de Raquel não estavam assim tão turvas, principalmente no que se refere à poesia DESEJO.
    Esta mulher é um tesão (palavra de quem conhece)!

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