1 de mar. de 2010

Quando se olhou no espelho não possuía mais nenhuma verdade nenhuma marca no seu rosto que pudesse expressar tanto desassossego sentiu vontade de quebrá-lo parti-lo ao meio assim como sua alma a sua identidade o seu eu fragmentado de decepções e desencantos não havia mais nada a configurar num mundo de desejos inúteis e na crença de fatos que nunca se concretizariam bateu com força a porta do banheiro imundo e voltou para a mesa ambos não se olharam apenas se tocaram mãos entrepostas num pedido de súplicas e o frio percorrendo aqueles corpos que nunca se pertenceram mas que já se desejaram os enormes óculos escuros escondiam as lágrimas agora já controladas que desaguavam mais uma vez naquele terreno fértil de imaginação e desapego a chuva lá fora contribuindo para ensurdecer ainda mais os sentimentos que se tornavam confusos e arredios e infinitamente amargos não havia como prosseguir o café esfriando e as mãos ainda unidas apertando-se cada vez mais para talvez não deixarem escapar a última gota de dignidade e sensatez e tudo num redemoinho de emoções intensas que a fumaça do cigarro só fazia confundir e o peito arfando descompassado e uma imensa vontade de gritar todas as verdades que carregava dentro de si e aquelas mãos insistentes tentando salvar o que agora deveria ser reconstruído (pois o coração estava em escombros) e as vozes se digladiavam no seu interior oco e mudo e negro e ainda uma puta ira lhe consumindo os nervos que estourariam em qualquer esquina e aquelas mãos novamente tentando afagar o rasgo profundo que causara naquele corpo recém- desvirginado pela realidade dura e fria que agora lhe esbofeteava a cara como uma mãe raivosa

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